Neste momento delicado que atravessamos em nossas carreiras, fico pensando nas agruras que passamos em nossas vidas e como somos fortes e não apenas “nas linhas avançadas”.
Enquanto alguns matam um leão por dia, temos de fazê-lo de hora em hora para sobreviver. Cada dia é uma surpresa desagradável: um reajuste que não vem; a carreira desprestigiada e esquecida; aumento nas contas de água, luz, plano de saúde ou escola, que doem de forma muito significativa em nossos bolsos.
Somos recriminados e discriminados pela escolha da nossa carreira, tal como os nordestinos no sul do país, que constroem prédios onde não podem entrar. A administração e nossos “ímpares” não reconhecem a importância do nosso trabalho para o funcionamento da máquina. Não percebem que se o nosso órgão fosse dividido em partes, com certeza seríamos o coração, não por causa de alguma bobagem sentimentalóide, e sim porque, tal como nós, ele bombeia sangue para o funcionamento do corpo, sem ele, só existe necrose e morte. E não adianta o cérebro “chiar”, como se diz na minha terra, afinal, ele pode ser sabido, mas não transporta vida.
Aliás, a morte é um assunto recorrente ultimamente na nossa instituição, em todas as classes. A depressão é sorrateira como um inimigo invisível. Os estudiosos dizem que é o mal do século, mas aqui, nas quatro paredes em que somos confinados na vida profissional, a “nossa” depressão é diferente da depressão dos outros colegas.
A depressão do Adm é uma deprê cult, chic, como “doença de rico”. Uma frescura, uma bobagem que não tem que ser levado em consideração. A verdade é que existem colegas de outros cargos que se matariam apenas por viver nas condições que vivemos, que não saberiam sequer como comer, morar e vestir com o salário que ganhamos.
Entramos aí na velha discussão que incomoda todo mundo: por que temos que ganhar menos? Por que não podemos desfrutar de uma vida digna como nossos colegas? Por que não podemos ter uma infraestrutura que nos dê um conforto merecido?
Atrelado a isso a pergunta que não quer calar: fizemos escolhas profissionais equivocadas?
Sinceramente? Não concordo com aqueles que pensam dessa forma. O que ocorreu, pelo menos no meu caso, foi uma mudança de regras no meio do jogo. O aumento salarial era isonômico, para todo o funcionalismo, no primeiro dia de maio. Hoje, cada categoria é contemplada depois de acirradas negociações; o direito à aposentadoria era adquirido após trinta anos de efetiva contribuição. Hoje, nem sabemos ao certo quando nos aposentaremos. Devo salientar que não somos um bando aproveitadores querendo tomar posse de cargos públicos a qualquer custo, sempre houve concurso para nossa classe não inventaram o concurso há dez anos.
E como informação aos leigos que desconhecem a nossa história e conseqüentemente vivem julgando do alto do seu parco conhecimento: ganhávamos um salário compatível com as outras categorias do órgão. Nosso erro foi acreditar que fazíamos parte de um grupo coeso quando entravamos em greves e abraçávamos as lutas de outros cargos para que houvesse uma melhoria no “todo”. No fim (apenas no fim!) era revelado que estávamos ali apenas para engrossar as fileiras e clamar pelas injustiças que faziam a outros, como se não tivéssemos nossos próprios problemas. No decorrer do tempo, esse “todo” se tornou divisível, e hoje estamos aqui, de lado nenhum, e sem ninguém ao nosso lado.
Sendo assim meus companheiros de categoria, estamos ilhados, cercados de tubarões enormes, mas não se preocupem, eles nos veem como algas e não são vegetarianos. Querem a carne e o sangue que pensam que não possuímos. Só nos resta abrir as velas e retomar o curso ou, como bons marinheiros, abandonar o barco.
Quem se sentir à vontade no posto de comandante que fique por último e apague a luz.
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