Leitura da caixa-preta comprova que o equipamento de comunicação do Legacy travou. Pilotos tentaram cinco contatos com o Cindacta1
Uma falha no sistema de comunicação do Legacy N600XL da ExcellAire foi o fator determinante para o choque com o vôo 1097 da Gol, que vinha de Manaus para Brasília no final da tarde do dia 29 de setembro, causando a morte de 154 passageiros e tripulantes. A leitura do data recorder (caixa-preta que registra os parâmetros seguidos pelo avião) comprovou que o transponder travou pouco depois de sobrevoar Brasília, impedindo qualquer transmissão e recepção de rádio. Como não existe nenhuma luz de alarme, o problema não foi apontado para os pilotos Joe Lepore e Jan Paladino.
O data recorder também comprovou que os pilotos realizavam um vôo rotineiro e nivelado, ao contrário dos dados registrados pelo 1º Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo (Cindacta 1), sediado em Brasília, e divulgados com exclusividade pelo Correio. Segundo as informações retidas pelo controle-radar, o Legacy variou sua altitude, a partir do Ponto Teres (450km ao norte da capital federal), entre 32 mil pés e 42 mil pés. Os pilotos, segundo a mesma fonte, agora desmentida, também teriam executado manobras bruscas para a direita e a esquerda, chegando a sumir da tela por alguns instantes.
“O data recorder não confirmou esses dados. O avião estava nivelado a 37 mil pés, sem transponder, completamente incomunicável e com o sistema anticolisão não-operacional”, disse uma fonte da Aeronáutica. Sem o transponder, o radar secundário, que serve para estabelecer a altitude do avião, fica completamente inoperante.
Segundo o diretor de Segurança de Vôo do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Carlos Camacho, “as variações registradas pelo Cindacta 1 podem ser atribuídas à falta de precisão do radar primário. Mas não é a primeira vez que transponders Honeywell travam a comunicação de uma aeronave. Por causa de um software defeituoso um modelo mais antigo foi banido do espaço aéreo europeu. Houve até um recall determinado pela fábrica”. O equipamento usado no Legacy é diferente e não apresentara nenhuma falha até a colisão.
Esforço em vão
O voice recorder (gravador de voz) registou cinco tentativas de comunicação dos pilotos do Legacy com o Cindacta 1. Ao mesmo tempo, os controladores tentavam um contato com a aeronave, solicitando que ligassem o transponder. Os conteúdos das mensagens mudaram a partir do momento em que o radar apresentou uma grande variação de altitude. Passaram a pedir que o avião seguisse o plano de vôo.
O último deles, em freqüência aberta, pediu que qualquer piloto próximo retransmitisse a ordem para o Legacy N600XL. “O data recorder do Legacy mostrou que o avião estava sintonizado com a freqüência de Brasília”, disse um investigador que teve acesso à caixa-preta, “mas nenhuma resposta foi registrada até o choque. A partir desse momento, os pilotos mudam para a freqüência internacional de emergência e as comunicações de bordo retornaram. O transponder também voltou a funcionar.”
As investigações agora avaliam os procedimentos adotados pelos controladores de vôo. A última comunicação com o Legacy, realizada pela Torre de Brasília, foi mal interpretada pelos pilotos norte-americanos. “Ela foi sucinta demais”, avalia um investigador. “Apenas confirma o registro do avião e deseja boa viagem, o que pode ter dado margem a erros”. O Cindacta 1 também ficou confuso com a altitude registrada pelo radar primário até o Ponto Teres. “A leitura indicava 36 mil pés, exatamente como previsto no plano de vôo. A partir daí o avião apresenta um, comportamento excêntrico, indicando uma emergência. Só que já se sabia que o transponder não estava funcionando.”
Pedro Paulo Rezende
Correio Braziliense
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