Depois de subir até 117% nos últimos sete anos, conta telefônica vai ficar um pouco mais barata. Mas para queda de até 0,5% entrar em vigor, governo precisa se mexer e definir nome do presidente da Anatel

Ronaldo de Oliveira/CB/15.2.06

O ministro das Comunicações, Hélio Costa, anunciou a redução

 

Os clientes das concessionárias de telefonia fixa terão um pequeno alívio na conta mensal. O ministro das Comunicações, Hélio Costa, anunciou ontem que as tarifas cairão neste ano. O movimento, inédito desde que o setor foi privatizado em 1998, ainda é tímido e, na prática, manterá os preços praticamente nos mesmos níveis atuais. Em Brasília, as tarifas fixas cairão 0,4222%. Nos demais estados, a redução vai variar entre 0,3759% e 0,5134%. O preço dos cartões para orelhão cairá em 0,43% em todo o Brasil. Ainda assim a notícia é boa para os bolsos de 42 milhões de usuários da telefonia fixa, que nos últimos sete anos viram o preço das ligações locais subir 117,78%.

Mas a comemoração pela primeira redução de preços no setor ainda terá que esperar. Para que a boa notícia vire realidade, o governo precisa definir quem assumirá a presidência da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Pela Lei Geral de Telecomunicações (LGT), apenas o presidente da reguladora pode homologar o reajuste, medida necessária para que ele tenha validade. E, há praticamente um mês, a Anatel está sem comando porque, até agora, o Palácio do Planalto não escolheu quem ocupará o cargo (leia mais abaixo).

O anúncio feito ontem marca a troca do sistema de cálculo do reajuste, que agora usa um índice setorial para medir as perdas reais das empresas de telefonia. Antes da mudança, as tarifas variavam conforme a inflação do Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) da Fundação Getúlio Vargas. O IGP-DI era bastante criticado pelos órgãos de defesa do consumidor por conta da forte variação nos últimos anos, causada pelas flutuações do dólar. Há três anos, a Justiça chegou a mudar o cálculo do reajuste, substituindo o fator previsto no contrato pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), bem mais baixo na época. A briga foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e até hoje o caso não foi julgado.

De vilão a mocinho

Essa turbulência em torno do reajuste estimulou a criação de um indexador específico para medir a inflação no setor de telecomunicações. Assim nasceu, no ano passado, o Índice de Serviços de Telecomunicações (IST). Como o novo índice tem apenas cinco meses de vida, a Anatel teve que completar o reajuste de 2006 usando o IGP-DI. Mas, ao contrário dos anos anteriores, a participação do antigo índice colaborou com a queda nas contas telefônicas.

De fato, o resultado negativo no reajuste deste ano foi causado pelo IGP-DI e não pelo novo índice. O antigo vilão das contas telefônicas acumulou uma queda de 0,14% nos últimos 12 meses. Enquanto isso, o IST nos primeiros cinco meses de vigência foi positivo, de 0,62%. Pelo método antigo de cálculo do reajuste, onde a Anatel reduzia a inflação em 1 ponto percentual para descontar a produtividade obtida pelas empresas durante o ano, as contas poderiam cair 1,14% neste ano ao invés de uma redução de 0,419 em média, como a anunciada ontem.

Embora a queda menor do que prevista no sistema antigo possa ser interpretada como um alento para as concessionárias, a reação ao anúncio do ministro não foi positiva. Apenas a Telefônica comentou as declarações de Hélio Costa e, mesmo assim, disse que irá aguardar ser comunicada oficialmente da decisão do percentual pela Anatel. A reclamação dos empresários é que a reguladora não teria permitido a transferência de até cinco pontos percentuais entre os itens do pacote de telefonia fixa, como previsto nos contratos.

Essa possibilidade, chamada de “fator de excursão”, acabaria elevando o reajuste para até 4,5% na assinatura ou no pulso local, desde que a empresa reduzisse o preço de outros serviços, como as chamadas de longa distância ou a habilitação do telefone. O ministro, no entanto, garantiu que o índice negativo não comprometerá o caixa das empresas.

análise da notícia

Governo atropela agência e fatura

Em ano eleitoral, notícia boa tem que ser divulgada o mais rápido possível. Parece ter sido essa a lógica usada ontem pelo governo ao anunciar o reajuste, de até -0,5%, na telefonia fixa. A velocidade com que o material foi capitalizado colocou o setor em polvorosa. A própria Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), responsável por negociar com as empresas, calcular, divulgar e publicar o reajuste, foi atropelada pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa. E tudo para anunciar uma coisa que ainda não se sabe quando irá valer.

O desleixo do governo com relação à Anatel levou a reguladora à absurda situação de não ter presidente há quase um mês. O que parecia apenas uma trapalhada política sem maiores conseqüências voltou-se contra o próprio Poder Executivo, que acabou se vendo com um excelente reajuste nas mãos que não tem validade na prática. Tudo porque, a lei determina claramente que o presidente da Anatel é quem valida o reajuste. Não adianta anuncio do ministro, nem do próprio presidente da República.

Não há data para solucionar a questão. Costa disse ontem que espera “que uma solução seja encontrada até sexta-feira”. A primeira possibilidade seria a nomeação de um substituto, o que deveria ter sido feito desde que o mandato provisório do conselheiro Plínio de Aguiar Júnior como presidente expirou, em 8 de junho. A segunda, e mais demorada, é escolher quem assumirá definitivamente o posto. Nessa hipótese, o nome deverá passar pelo crivo do Senado Federal antes da nomeação, o que, em situações normais, leva mais de um mês. Às vésperas das eleições, a manobra torna-se ainda mais complicada.

A responsabilidade para que a Anatel chegasse a tal situação de abandono passa por muitas entidades. Primeiro pelo governo, que não providenciou uma substituição da presidência, mesmo que provisória. Depois do PMDB, que desde o ano passado briga internamente para definir quem ficará com o cargo, já destinado ao partido por um acordo político com o Planalto. E, por fim, da própria Anatel que, com medo de novas retaliações do governo — como um contingenciamento de verbas mais alto no próximo ano — se calou diante da situação. Quem sai perdendo com tudo isso é o consumidor. Embora para o governo a boa notícia seja, eleitoreiramente, bem real, para a conta de milhões de clientes, o reajuste negativo não passa de um sonho.

Mariana Mazza da equipe do Correio