Nos últimos três anos, a Polícia Federal enfrentou 16 suicídios entre seus servidores. Apesar do número assustador, o governo segue insensível aos pleitos dos profissionais de saúde do órgão, representados pelo SINPECPF, conforme lembrou a presidente do sindicato, Leilane Ribeiro, em audiência pública promovida hoje (10) pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) para debater o problema.
 
"Precisamos fortalecer as equipes voltadas para o acompanhamento em saúde mental e psicossocial para combater a onda de suicídios que assola a PF", alertou Leilane, chamando atenção para o pequeno o contingente de profissionais da área biopsicossocial atuando no órgão. "Em um universo de 15 mil servidores, temos apenas 15 psicólogos, 13 psiquiatras, 29 assistentes sociais e seis enfermeiros. É muito pouco", ressaltou, enfatizando que o ideal seria que cada unidade do órgão contasse com pelo menos um profissional de cada uma das especialidades.
 
"Essa é uma das maiores preocupações dos nossos profissionais de saúde psicológica. Eles gostariam de ver pelo menos uma equipe dessas em cada superintendência e nas maiores unidades", explicou Leilane. Outro ponto atacado pelo sindicato foi a vinculação da PF ao Subsistema Integrado de Atenção à Saúde do Servidor (SIASS), sistema pelo qual a PF compartilha seus profissionais de saúde com outros órgãos federais.
 
"O SIASS não possui um atendimento humanizado. Não há um acompanhamento psicológico adequado. O policial fala com um psicólogo hoje e, na outra semana, é atendido por outro, de outro órgão, que não entende a realidade policial. Fica impossível avançar no tratamento assim", esclareceu a presidente, que também lembrou que o formato do SIASS acaba afastando os profissionais de saúde da PF do cotidiano do órgão.
 
Leilane também falou sobre a resistência de parte dos policiais em procurar atendimento psicológico. "Alguns têm vergonha, existe preconceito", apontou. Em função disso, outra sugestão apresentada pelos profissionais de saúde da PF é a ampliação da rede de assistência à saúde dos planos de saúde vinculados à PF, com a realização de parcerias para encaminhamentos a profissionais da área de saúde mental  (psicólogo e psiquiatra). "A maioria dos suicídios pode ser evitada se houver um tratamento preventivo", frisou.
 
A presidente ainda pediu atenção ao crescimento dos casos de depressão no órgão, e lembrou que os administrativos também são afetados pelo problema. "Dois dos suicídios foram de colegas administrativos. Sofremos assédio moral e não somos devidamente reconhecidos", lamentou ela, colocando-se à disposição para tentar mudar essa realidade. "Esperamos participar dos próximos debates, pois a questão nos afeta e queremos colaborar com os parlamentares", registrou.

O vídeo com o discurso da presidente pode ser baixado aqui. Basta clicar.
 
Policiais pedem socorro — Os representantes da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) pediram socorro aos parlamentares. "Queremos que vocês intervenham junto ao Executivo", clamaram. O presidente Jones Leal chamou atenção para o crescente número de colegas em licença para tratamento de problemas de saúde psicológica. "Mais de 30% dos colegas está ou esteve de licença no último ano por isso. É muito mais que o aceitável".
 
Leal também denunciou o clima de segregação dentro do órgão, afirmando que a gestão da PF trabalha hoje em prol de apenas um cargo. "Agentes, escrivães, papiloscopistas e administrativos não têm oportunidades e são discriminados", protestou. "Parece que reclamamos de pequenas coisas, mas de lágrima em lágrima, o copo enche e transborda com o suicídio".
 
As palavras do presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Distrito Federal (Sindipol/DF), Flávio Werneck, e do Sindicato dos Policiais Federais do Rio Grande do Sul (Sinpef/RS), Ubiratan Sanderson, foram na mesma linha. Werneck também chamou atenção para os "dois pesos e duas medidas" observadas nas punições disciplinares. "A pena para EPAs e administrativos é sempre maior. Onde está a igualdade?", reclamou, citando recente caso de delegado que sofreu punição de três dias por usar viatura para fins particulares. Pela mesma acusação, um administrativo foi demitido do órgão.
 
A pesquisadora da Universidade de Brasília (UnB) Ana Magnólia Mendes — que em 2012 coordenou estudo para avaliar o clima institucional entre os policiais federais — chamou atenção para os riscos advindos dos problemas psicológicos dos policiais. "Como confiar a nossa segurança a profissionais em tão elevado grau de estresse?".
 
Para a especialista, a onda de suicídios e o aumento dos casos de depressão estão relacionados com o modelo organizacional e de gestão do órgão. "Exige-se demais dos servidores, mas não se garante as condições necessárias para o trabalho. Além disso, quem executa o trabalho não atua no planejamento das rotinas", avaliou.
 
Parlamentares — O presidente da CDHM, deputado Paulo Pimenta (PT/RS), lamentou a ausência de representante da diretoria da PF no debate. "A Direção-Geral disse que o tema é importante, mas que não é apropriado debatê-lo em uma audiência pública", revelou, gerando protestos entre os presentes. De acordo com a Direção-Geral, a questão será debatida no próximo encontro entre diretores e superintendentes.
 
Paulo Pimenta também adiantou que a CDHM promoverá uma nova audiência para tratar das condições de trabalho nos órgãos de segurança pública e garantiu que o SINPECPF será covidado.
 
O deputado Marcos Rogério (PDT/RO) considera que a falta de regulamentação da indenização de fronteira demonstra como os servidores da PF são assediados em seu dia a dia até mesmo pelo governo. "Sugiro que a comissão provoque o Executivo para cobrar a regulamentação".