Déficit de abastecimento de eletricidade aumenta 15% e supera em três vezes os limites definidos como toleráveis pelo governo

O grande volume de chuvas no início deste ano não afastou o risco de problemas no suprimento de energia elétrica entre 2009 e 2010, avaliam empresas do setor. A Tractebel, por exemplo, declarou isso explicitamente em seu balanço, afirmando que optou por ter “parte substancial de sua disponibilidade (de energia) descontratada a partir de 2009, quando previsões do setor apontam para um potencial aumento de preço”.

O mesmo cenário foi traçado pela Comerc, comercializadora independente de energia do país, que divulgou estudos mostrando que o chamado risco de déficit para 2009 subiu para 15%, ou cerca de três vezes acima dos limites definidos como toleráveis pelo governo. O risco de déficit não é um indicador preciso, trabalha com probabilidades, mas todo o empenho do governo é manter esse indicador abaixo do limite de 5%, especialmente na região Sudeste.

Pelos cálculos da Comerc, o risco no Sudeste subirá dos 4% em 2008 para 15,25% em 2009, 29,05% em 2010 e 34,45% em 2010. “Esse é o retrato de março, mas pode ser alterado se surgir um fato novo, como a maior oferta de gás natural para as térmicas”, explicou Marcelo Parodi, diretor da Comerc.

Outro sinal de “percepção de escassez” de energia elétrica tem ocorrido no mercado livre, organizado pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). Tradicionalmente as geradoras cobram um ágio de cerca de 20% a 30% do preço de referência no mercado livre, que está em R$ 17,59 por MW/h. O ágio subiu para 45% em janeiro e 60% em fevereiro. “Isso apesar de os reservatórios das hidrelétricas estarem cheios”, complementou Parodi.

Térmicas

Na avaliação de uma fonte do governo, a explosão do risco de déficit em março reflete basicamente a retirada das usinas térmicas da Petrobras do grupo de usinas que podem ser operadas pelo Operador Nacional do Sistema (ONS). A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) retirou usinas no montante de cerca de 3 mil MW de potência, com impacto imediato na quantidade de energia que pode atender ao sistema elétrico. E essa oferta só voltará a ser considerada quando a Petrobras assinar um “termo de ajustamento de conduta” detalhando os prazos para ampliar a oferta de gás natural no país, seja por meio de GNL (gás liquefeito) ou pela construção de novos gasodutos.

“Até agora a Petrobras não assinou esse termo de conduta e não há um prazo para que isso ocorra. Enquanto isso, o mercado tende a ficar pressionado”, completou. Nos contatos que tem mantido com o governo, a Petrobras garante que está acelerando os seus investimentos no setor de gás natural e haverá oferta suficiente já no final de 2008. “O problema é que, até agora, a Petrobras não formalizou esse compromisso. Por isso essa oferta adicional ainda não pode ser considerada no planejamento do ONS. Se a Petrobras assinar o contrato garantindo esse prazo o quadro se altera totalmente”, acentuou o técnico.