Ao invadir as dependências do Congresso Nacional anteontem, o Movimento de Libertação dos Sem-Terra (MLST) pretendia interromper o funcionamento da Câmara dos Deputados. A conclusão é dos serviços de inteligência da Polícia Federal e polícias Civil e Militar do Distrito Federal. As investigações mostraram que a intenção dos líderes do movimento era conseguir ocupar o próprio plenário e lá permanecer por pelo menos duas horas. Se desse, eles queriam usar até os microfones do plenário para defender um modelo radical de reforma agrária e causar grande repercussão no país e no exterior.
Ao contrário do que declarou o coordenador do movimento, o engenheiro Bruno Maranhão, o MLST se preparou com bastante antecedência para a invasão. Segundo a Polícia Civil, os coordenadores estavam em Brasília há cerca de dois meses. Visitavam o Congresso quase que diariamente. A invasão foi uma cuidadosa ação política, planejada como um ataque de guerrilha pelo menos duas semanas antes da “festa”, como os líderes do grupo chamaram a ação. O objetivo do grupo era ocupar o “salão de baile”, como foi denominado o Salão Verde durante o planejamento, onde fica a entrada principal do plenário da Câmara.
Todo o plano do MLST foi confirmado pela polícia com a apreensão de uma fita de vídeo em poder de um dos militantes do movimento. Com 1 hora e 20 minutos, a fita mostra que, um dia antes da invasão, quatro grupos, com 10 militantes cada, visitaram as dependências da Câmara para reconhecer o terreno e saber como se movimentar pelos corredores. Cada um destes militantes, chamados de “vanguarda” do MLST, tinha a função de entrar e aguardar dentro da Câmara o restante dos manifestantes que iriam chegar em 10 ônibus de várias regiões do país. A função deles era garantir que pelo menos três portas da Câmara permanecessem abertas para que todos entrassem e chegassem ao Salão Verde. A orientação era para que, se o grupo se encontrasse dentro do Congresso, fingisse que não se conhecia.
Os militantes foram divididos em quatro grandes grupos. Cada um com 25 pessoas, coordenados por um militante que se responsabilizaria por “fiscalizar” uma das portarias. “Vamos dizer para o Brasil que tipo de reforma agrária queremos. Vamos dizer o que essa corja do PFL e do PSDB está fazendo nesse Congresso, quando deixou de votar o Orçamento da União achando que estava prejudicando o Lula”, discursa Antônio Baqueiro, um dos líderes do movimento. E continua: “E o Lula continua aí tranqüilo, com 63% (nas pesquisas). Parece cavalo de 7 de setembro: vai cagando e andando e os outros olhando”, diz Baqueiro para uma platéia de cerca de 50 militantes. Baqueiro está preso. O coordenador Bruno Maranhão não aparece nas filmagens.
Desde a manhã do dia da invasão, segundo os serviços de inteligência, os manifestantes começaram a circular pelo Congresso, como tinham planejado. Eram grupos de quatro ou cinco pessoas e andavam pelos corredores da Câmara. A segurança percebeu a movimentação e tentou impor mais rigor nas portarias de acesso. Mas foi tarde. O número de militantes circulando nos corredores da Câmara àquela altura já era grande. O grupo ainda teria combinado uma senha para dar início aos ataques de vandalismo: duas mulheres simulariam uma discussão com seguranças. Neste momento, os demais forçariam a entrada derrubando e quebrando as portas de vidro.
Na reunião preparatória, que ocorreu no dia anterior ao ataque, nas dependências da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), a orientação dos coordenadores era que os militantes chegassem ao Congresso de calça, e não de chinelo e bermudas como usam diariamente. Levassem o documento de identidade e, se questionados, informassem na portaria que iriam visitar o gabinete de um deputado do estado. A Contag divulgou nota ontem lamentando e repudiando a violência dos atos cometidos contra a Câmara. “O Poder Legislativo é a expressão do direito à democracia em nossa sociedade. Agredir o Parlamento do Brasil é agredir a democracia do país”, diz a nota. A Contag defende a manifestação dos movimentos sociais, mas não concorda com atos de violência.
Os participantes do quebra-quebra negaram em depoimento à polícia que a ação planejada fora premeditada. Todos alegaram que planejavam participar de uma manifestação pacífica e que teriam reagido a uma suposta ação violenta da Polícia Legislativa da Câmara. Bruno Maranhão, preso na Papuda, declarou à polícia que não estava presente no momento da depredação e que, quando chegou, tentou acalmar os ânimos. Há casos extremos, como o da manifestante Franciele Denísia Assêncio, que foi filmada quebrando equipamentos da Câmara. Ela negou ter participado de qualquer depredação, mesmo depois de assistir às imagens.
Alguns (seguranças) são armados, outros não. Mas eles não vão dar tiro em ninguém
A nossa ação vai botar em xeque a segurança desse Congresso
Ali (Anexo 2) dá pra fazer um cavalo doido, ali, (dá para) entrar arrebentando
Inclusive (vocês) vão estar de paletó e gravata, tudo em cima da pinta para poder andar em tudo quanto é lugar do salão de baile
Leonel Rocha, Mário Coelho e Marcelo Rocha Da equipe do Correio
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