O governo já tem pronto o texto de um projeto de lei para criar uma espécie de juizado especial da administração pública para analisar pedidos de indenização feitos por pessoas que tenham sido lesadas de alguma forma por funcionários públicos ou por empresas prestadoras de serviço público. O texto, chamado de Lei de Responsabilidade do Estado (LRE), mudará a mentalidade da União na solução de seus conflitos.
Hoje, mesmo admitindo ser responsável pelo dano provocado a um cidadão, o governo recorre invariavelmente até a última instância na Justiça para evitar o pagamento da indenização. A intenção principal do governo, de acordo com um ministro, é facilitar a vida do cidadão que é prejudicado pelo Estado.
Mas a conseqüência imediata será livrar a União de pequenos e numerosos processos que chegam ano a ano à Justiça e que fatalmente são decididos em favor do contribuinte.
A proposta, que será incluída no texto da Lei 9.784, de 1999, permitirá que casos simples, como acidentes de carro provocados por veículos oficiais ou queima de equipamentos gerada por picos de energia, ou mesmo conflitos mais complexos, como danos morais em decorrência do vazamento de grampos telefônicos em operações policiais, sejam resolvidos rapidamente pela Advocacia-Geral da União, sem a necessidade de intermediação da Justiça.
Sem Advogado
Para isso, a lei determinará que o interessado deverá protocolar no órgão que lhe causou o dano um requerimento em que descreverá os fatos ocorridos, o valor do pedido de indenização e uma declaração de que não acionou a Justiça para resolver esse problema. Além disso, deverá incluir seus dados pessoais, como nome, número dos documentos e o endereço para o recebimento das comunicações do processo. Em nenhum momento precisará do auxílio de um advogado.
As demandas serão analisadas e decididas pela Advocacia-Geral da União. Caso a requisição seja atendida e o valor inscrito até o dia 1º de julho, o pagamento será efetuado até 31 de dezembro do ano seguinte em conta que será aberta pelo interessado somente para essa finalidade.
Se o interessado ficar insatisfeito com o valor, ele poderá recorrer à própria AGU. Se depois da revisão ele permanecer descontente, poderá acionar a Justiça.
Depois do pagamento da indenização, a Advocacia-Geral deverá instaurar um procedimento administrativo para identificar o agente público responsável pelo dano causado ao cidadão.
No caso de um acidente de carro, por exemplo, a investigação precisará mostrar se o motorista do carro oficial foi, por exemplo, imprudente e teve culpa pela batida.
Se houver essa comprovação, o motorista será intimado a ressarcir os cofres públicos no prazo de 30 dias. Se o pagamento não for feito, uma ação judicial contra o agente será aberta a pedido do governo.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mattos, avalia como “salutar” a proposta, mas ressalva que o cidadão sempre poderá recorrer ao Judiciário e diz que a lei só terá efetividade se o governo fizer uma avaliação isenta de cada caso.
“Se não houver o entendimento de que a administração pública deve atuar como órgão de Estado, muitas vezes discordando dos argumentos dos próprios órgãos e, dando razão para os particulares, essa iniciativa não vai levar a nada e não vai desafogar o Judiciário”, afirma.
“Tudo isso vai depender da cultura da AGU e do espírito que vai orientar o julgador, porque se houver uma cultura burocrática de indeferir qualquer pedido do particular, a lei vai cair no descrédito”, acrescenta.
(Fonte: Folha de São Paulo)
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