A Polícia Federal interrogará, pela segunda vez, o ex-coordenador de comunicação da campanha ao governo de São Paulo de Aloizio Mercadante (PT-SP) e deverá indiciá-lo por delitos comuns, como lavagem de dinheiro, crime contra o sistema financeiro e formação de quadrilha. Hamilton Lacerda é suspeito de ter levado os R$ 1,75 milhão a um hotel em São Paulo para ser usado na compra do dossiê contra tucanos. O dinheiro foi apreendido pela polícia em 15 de setembro em poder de Gedimar Passos e Valdebran Padilha. A PF aguarda a conclusão de relatório em elaboração no setor e inteligência da instituição para convocar Lacerda novamente, o que deve ocorrer ainda esta semana.

Os investigadores trabalham para reunir provas que dêem mais consistência a um eventual indiciamento dos principais envolvidos. O delegado Diógenes Curado, responsável pelo inquérito que apura o envolvimento de petistas com a compra do dossiê Vedoin contra políticos tucanos, admitiu ontem que até agora as investigações não detectaram crime eleitoral na ação dos petistas. Mas sinalizou que o grupo deve ser enquadrado por delitos comuns, como lavagem de dinheiro, crime contra o sistema financeiro, formação de quadrilha e utilização de documentos falsos.

Além do próprio Lacerda, esses crimes seriam imputados a Valdebran Padilha, Gedimar Passos e Osvaldo Bargas, os principais articuladores da compra do dossiê Vedoin. O ex-analista de risco e mídia do comitê central pela reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-diretor do Banco do Estado de Santa Catarina Jorge Lorenzetti, conhecido como o “churrasqueiro” do presidente Lula, também está sendo investigado e pode ser indiciado pelo crime de lavagem de dinheiro.

No caso do ex-assessor de Aloizio Mercadante, ele foi flagrado pelo sistema de vídeo de hotel em São Paulo carregando uma bolsa preta, na qual a PF acredita que estava o dinheiro. Em seu primeiro depoimento, ele afirmou que transportava boletos de arrecadação da campanha presidencial, além de roupas. A versão não convenceu a polícia. Interrogado, o presidente afastado do PT, Ricardo Berzoini, estranhou a declaração porque não seria função de Lacerda transportar o tal material.

Peritos

Os indiciamentos dependem de um relatório do setor de inteligência que está identificando cada um dos crimes cometidos pelos petistas “aloprados”, como o grupo foi chamado por Lula quando soube da operação Vedoin. O relatório está sendo elaborado com a ajuda dos peritos contábeis da polícia e pretende identificar quem encomendou a compra de dólares realizada na Vicatur Câmbio e Turismo e em outras casas de câmbio (leia matéria ao lado).

Se a PF conseguir provas de que os petistas envolvidos no escândalo cometeram crime eleitoral, as investigações terão que ser transferidas para o Supremo Tribunal Federal (STJ), já que o então presidente do PT e então coordenador da campanha nacional pela reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Ricardo Berzoini, é deputado federal reeleito. A própria campanha eleitoral do presidente só pode ser investigada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).  

Buscas em casas de câmbio

A Polícia Federal vai realizar, ainda esta semana, buscas e apreensões em casas de câmbio de São Paulo, Minas Gerais e Santa Catarina para saber quem é o responsável pela compra de US$ 139 mil encontrados com petistas em 15 de setembro, no Hotel Íbis, em São Paulo. O dinheiro fazia parte do lote de US$ 248,8 mil apreendidos com petistas e que serviria para comprar documentos que pudessem comprometer os ex-ministros da Saúde José Serra e Barjas Negri com os sanguessugas.

A PF já identificou uma parcela de US$ 109,8 mil sacados na Vicatur Câmbio e Turismo Ltda., de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, e comprados por sete pessoas de uma mesma família utilizadas na operação como “laranjas”. O dinheiro, em notas seriadas e comprado pela empresa fluminense no Banco Sofisa, teria sido repassado a Hamilton Lacerda, ex-assessor e então coordenador de comunicação da campanha derrotada do senador Aloizio Mercadante (PT-SP) ao governo de São Paulo.

Dos sete laranjas da mesma família, quatro sacaram o dinheiro na Vicatur com a conivência dos próprios donos da corretora, Fernando Ribas e Sirley da Silva Chaves, interrogados semana passada e indicados por crime contra o sistema financeiro e lavagem de dinheiro. Segundo fontes da PF, outros “laranjas” dos petistas podem ter sacado os US$ 139 mil restantes na própria Vicatur.

Corretoras

O rastreamento é feito a partir de um banco de dados fornecido à polícia pelo Banco Central, por determinação da Justiça Federal no Mato Grosso. O arquivo engloba as transações em dólar realizadas pela Vicatur entre os dias 15 de agosto e 14 de setembro, véspera da apreensão do dinheiro em São Paulo. Para analisar as movimentações financeiras em reais feitas pela casa de câmbio também nesse período, os policiais pediram ao Judiciário a quebra do sigilo bancário da empresa.

Além da Vicatur, os investigadores estão analisando ainda outros possíveis caminhos percorridos pela moeda estrangeira até chegar às mãos de Hamilton Lacerda. Entre as corretoras investigadas pela PF estão a Centauros, de Florianópolis, e a Disk Line, de São Paulo. Estas duas casas de câmbio podem ter vendido a outra parte dos dólares apreendidos com os petistas (US$ 139 mil).

O setor de inteligência da PF trabalha em um relatório que descreverá a trajetória de um lote de US$ 29 milhões que entrou no país, dentro da lei, por intermédio do banco Sofisa, de São Paulo. A instituição negociou a moeda estrangeira na primeira quinzena de agosto e os distribuiu para várias empresas, entre corretoras, casas de câmbio e agências de turismo. Foi exatamente desse lote que, segundo a PF, saíram pelo menos US$ 110 mil dos US$ 248,8 mil que estavam com os petistas.

Leonel Rocha

Correio Braziliense