Laudo do Instituto Nacional de Criminalística contesta relatório de empresa que apontava escuta em linhas de ministros
Marco Aurélio, presidente do TSE, afirma que quem fez grampos teve “tempo bastante” para retirá-los e ironiza versão da polícia
A Polícia Federal informou ontem que não houve grampo ilegal em linhas telefônicas do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) nem do STF (Supremo Tribunal Federal). A conclusão se baseou em um laudo elaborado pelo Instituto Nacional de Criminalística (INC).
Os grampos foram detectados pela empresa Fence Consultoria Empresarial Ltda que, desde 2003, foi contratada pelo TSE para fazer varreduras periódicas em linhas telefônicas diretas utilizadas pelos ministros do tribunal.
Conforme o relatório da Fence, divulgado por meio da imprensa no dia 14 de setembro, foram grampeados o presidente do TSE, o ministro Marco Aurélio Mello, e os ministros do tribunal Marcelo Ribeiro e Cesar Peluso.
Dois dias depois, a PF instaurou inquérito para investigar o caso, seguindo determinação do procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza. A perícia foi realizada nos dias 20 e 21 de setembro.
Conforme o relatório da Fence, a medição da freqüência de linhas utilizadas e para as quais o TSE determinou a varredura na ocasião apontou a existência de grampos nos telefones utilizados pelos ministros Marco Aurélio e Peluso no STF, bem como no aparelho de fax do gabinete do ministro do TSE Marcelo Ribeiro.
Pelo contrato firmado com o TSE em 2003, sem licitação (com base em “notória especialização”), a Fence deve fazer pelo menos uma varredura mensal de linhas diretas utilizadas por ministros do tribunal -entendimento que abrange também a residências e os gabinetes daqueles que atuam no Supremo.
Marco Aurélio ironizou a informação da PF sobre a inexistência de indícios de grampo e defendeu a empresa Fence, que detectou a interceptação e avisou ao TSE. “Faz de conta que não houve grampo”, protestou.
Marco Aurélio disse que quem colocou o grampo teve “tempo bastante” para retirá-lo entre o momento em que o TSE recebeu relatório da Fence, com essa informação, e a varredura da PF, cinco dias depois.
“Eu soube que não encontraram nada, mas isso já era presumível. A coisa veio à tona na sexta-feira, houve tempo bastante para aqueles que colocaram retirarem. A minha parte eu fiz, que foi comunicar ao procurador-geral e ao ministro da Justiça e escancarar a mazela”, disse o presidente do TSE.
“Continuemos no grande âmbito do faz-de-conta. Faz de conta que não houve grampo.”
Ele admitiu a possibilidade de a empresa Fence ter se equivocado, mas disse não acreditar nessa hipótese.
Segundo a Polícia Federal, mesmo que tenha havido um tempo entre a divulgação e a perícia não há nenhuma indicação do grampo. Por meio de sua assessoria, a PF informou ainda que, “uma vez identificado o grampo, a empresa deveria ter preservado o local e imediatamente informado à autoridade policial, dois procedimentos que não foram adotados”.
Fence diz que laudos são de dias diferentes A empresa Fence pertence ao coronel reformado do Exército Ênio Gomes Fontenelle, que foi chefe do setor de telecomunicações eletrônicas do Serviço Nacional de Informações, órgão da ditadura militar, durante dez anos. Sobre o laudo da Polícia Federal, elaborado pelo Instituto Nacional de Criminalística (INC), Fontenelle afirmou que “são dois timings diferentes”.
“O meu laudo é de um dia, o da PF de outro. Se eu fosse o agressor, eu também limparia tudo”, disse ele reafirmando que sua varredura estaria correta.
Em depoimento à PF, Fontenelle detalhou os procedimentos adotados pela empresa.
Mensalmente, o TSE convoca a Fence para vistorias que podem ter como alvo até 60 linhas telefônicas por vez, a um custo de R$ 250 cada. Segundo a Folha apurou, mensalmente a empresa analisava cerca de 45 linhas.
Essa foi a primeira vez que a empresa detectou, com base nas oscilações de freqüência, a indicação de que houve grampo. A apuração da PF foi formalmente solicitada pela presidente do STF, ministra Ellen Gracie Northfleet, ao ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça).
ANDRÉA MICHAEL e SILVANA DE FREITAS
Folha de S. Paulo
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