Presidente do PMDB e líder do PT pedem revisão do reajuste de subsídios, mas há resistências
A reação negativa da opinião pública e de entidades civis ao aumento de 90,7% dos subsídios dos parlamentares, aprovado na quinta-feira passada, já começa a provocar polêmica entre os próprios deputados e senadores, e pode levá-los a rediscutir a decisão. Ontem, integrantes das cúpulas do PT e do PMDB defenderam que o assunto volte a ser debatido pelo Congresso. O presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), admitiu o constrangimento com a repercussão e sugeriu que o aumento siga os índices de inflação nos últimos quatro anos. Isso elevaria os subsídios de R$12.800 para R$16.500, em vez dos R$24.600 aprovados na quinta-feira.
– Esse é um assunto para ser reconversado esta semana na Câmara e no Senado. A repercussão foi extremamente negativa. Não houve uma palavra sequer de compreensão e de apoio – disse Temer.
O presidente do PMDB, que já presidiu a Câmara dos Deputados em duas oportunidades, disse achar razoável que a proposta de reajuste siga os índices de inflação:
– Seria uma coisa razoável. Acho que seria menos de 30%, cerca de 20 e poucos. Acho que deve haver um reconversação sobre esse assunto porque a repercussão foi muito negativa e isso não é bom nem para o Congresso e nem para o país. Nós temos que compreender isso e temos que propor uma fórmula que seja adequada.
A tentativa de recuo, porém, já enfrenta resistências de parlamentares que apoiaram o reajuste. O líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia, reagiu com irritação ao recuo de Temer. Ele acusou o peemedebista de ter se omitido quando o aumento foi aprovado, em acordo de líderes partidários com os presidentes da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
– A decisão do aumento está tomada. Ele podia ter feito essa crítica antes da reunião, mas preferiu o silêncio.
Maia insinuou que o recuo de Temer foi sugerido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Temer defende a participação do partido no governo federal e, segundo o pefelista, espera ser indicado para um ministério.
– O Temer podia começar abrindo mão da aposentadoria dele como procurador – ironizou o pefelista.
“Ninguém questiona os salários do STF”
O líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS), propôs que o reajuste, decidido em reunião fechada, seja submetido ao plenário. Ele votou contra a equiparação dos subsídios ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal, ao lado do deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) e da senadora Heloísa Helena (PSOL-AL).
– Temos que voltar ao ambiente de razoabilidade política. Há um repúdio da sociedade em relação ao Congresso porque a proposta foi descalibrada. O plenário é que deve decidir e, aí, creio que o aumento não sairá assim. Vou apoiar qualquer ação para tornar viável o recuo desse aumento abusivo.
Segundo a assessoria jurídica da Câmara, o aumento só poderá ser votado se os parlamentares apresentarem projeto de decreto legislativo com novos valores para os subsídios. Provavelmente será essa a saída para barrar os supersalários.
O líder do PR (ex-PL) na Câmara, Luciano Castro (RR), também reagiu às propostas de revisão do aumento e disse que os parlamentares insatisfeitos deveriam devolver o valor do reajuste aos cofres do Congresso.
– Ninguém questiona os salários do Supremo. Se quiser reduzir os salários dos parlamentares tem que reduzir também os salários da Justiça. Foi estabelecido um critério.
Ao ser informado sobre as propostas de recuo, Aldo se irritou e disse que só falaria hoje sobre o assunto.
O líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar, disse que vai pedir uma nova reunião das Mesas Diretoras do Senado e Câmara com os líderes dos partidos para quarta-feira. Ele elogiou a proposta de Temer e disse que o aumento foi anunciado após uma consulta, sem deliberação formal.
– Se o presidente do maior partido do Congresso na próxima legislatura está sensibilizado, acho que é possível que os líderes reconsiderem. Seria a melhor iniciativa a se tomar diante do clamor das ruas – afirmou o deputado, para quem uma ação judicial seria muito demorada e ineficaz.
Chico teme que o corporativismo fale mais alto, às vésperas da eleição para a presidência de Câmara e Senado:
– O aumento é legal, só não é legítimo. O Aldo está constrangido. Ele preferia solução menos exagerada.
No sábado, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Odilo Scherer, classificou o reajuste de escandaloso:
– É lamentável um aumento tão grande enquanto se briga por uns poucos reais para aumentar o salário mínimo. Essa decisão dos parlamentares é escandalosa.
Recurso à Justiça será discutido em reunião hoje
Os deputados e senadores que são contra o aumento de 90,7% dos subsídios dos parlamentares se reunirão hoje pela manhã para decidir que tipo de ação será apresentada à Justiça, pedindo que o reajuste seja declarado ilegal. Eles avaliam duas possibilidades: uma ação popular na Justiça comum ou um mandado de segurança, com pedido de liminar, no Supremo Tribunal Federal (STF).
A idéia, explicou o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), é garantir uma decisão imediata sobre o assunto. O mandado de segurança no Supremo, por exemplo, poderia ter uma resposta mais rápida do que uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin). “Esta, para ter validade final, precisa passar pelo crivo do plenário do STF, que entrará em recesso esta semana.
– Com o mandado de segurança ou a ação popular, a decisão é monocrática, sai mais rápido – afirmou Jungmann, que se reunirá com Fernando Gabeira (PV-RJ), Carlos Sampaio (PSDB-SP), Roberto Freire (PPS-PE) e outros que são contrários ao subsídio de R$24,5 mil.
A ação vai questionar se as Mesas Diretoras da Câmara e do Senado têm autonomia para decidir sozinhas o aumento salarial dos parlamentares. O entendimento é de que essa determinação teria de passar pelo plenário das Casas, onde todos dariam seu voto aberto. Outro ponto que pode ser questionado trata do artigo 37 da Constituição federal, que aborda o teto salarial dos servidores públicos e leva em conta todos os vencimentos: ninguém pode ganhar mais de R$24,5 mil mensais, contando aposentadorias, por exemplo. Muitos parlamentares já são aposentados e, com o aumento, violariam a Constituição.
Para o ministro do STF Marco Aurélio de Mello, se há parlamentares que passarão o teto de R$24,5 mil, é possível a contestação do aumento.
Adauri Antunes Barbosa
O Globo
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