Segunda leva de aumentos deve beneficiar 300 mil trabalhadores. Uma terceira medida provisória contemplará as carreiras típicas de Estado
Com a edição ontem da medida provisória (MP) que reajusta os salários de parte do servidores civis do Executivo federal e dos militares, o governo encerra apenas a primeira etapa do acerto de contas com o funcionalismo. Pelo menos 15 categorias correm contra o tempo para fechar acordos e querem ser incluídas em duas novas MPs. Dinheiro não é problema. O pedido de verba extra feito pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no valor de R$ 7,56 bilhões, dará sustentação orçamentária aos atuais e aos futuros aumentos.
Aguardam na fila os servidores do Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes (Dnit), os funcionários administrativos do Ministério da Fazenda e os da Ciência e Tecnologia, entre outros. Os funcionários da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que deveriam ter sido contemplados, serão atendidos na próxima proposta. Um erro de redação no texto enviado à Casa Civil fez com que esses servidores fossem retirados da MP. Pelo acerto, a categoria tem direito a uma recomposição salarial de 76%, dividida em duas vezes, prevista para ser paga ainda em 2008.
A Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef) estima que 300 mil pessoas serão beneficiadas pela segunda leva de aumentos. Apesar de lentas, as conversas entre os sindicatos e o Ministério do Planejamento avançaram na semana passada e o fantasma de uma greve geral deixou de assombrar a mesa de negociações. A previsão dos sindicatos é que a nova MP seja publicada este mês.
Um terceiro grupo também espera concluir em breve os termos de acordos que estão sendo discutidos com a Secretaria de Recursos Humanos (SRH), vinculada ao Ministério do Planejamento. Ainda que menos numeroso, o contingente formado pelas chamadas carreiras típicas de Estado é estratégico para o bom funcionamento da máquina. Há cerca de 20 dias, algumas dessas categorias promovem semanalmente greves de 24 horas como forma de pressionar a SRH a melhorar as propostas.
Os servidores do Banco Central, que chegaram a ameaçar cruzar os braços, mas acabaram recuando, fazem parte desse grupo de elite. Assim como outros setores, os funcionários do BC estão insatisfeitos porque já deveriam ter recebido os reajustes prometidos no ano passado. Em situação semelhante, estão os funcionários do Tesouro Nacional, da Controladoria-Geral da União (CGU) e os gestores públicos. Advogados públicos e auditores-fiscais da Receita Federal, que encerraram há poucas semanas greves de mais de dois meses, também esperam pela formalização dos reajustes. Ainda não há previsão para publicação da MP com as reestruturações das carreiras de Estado.
Agências
Ontem, servidores de agências reguladoras fizeram uma paralisação de advertência e prometem ficar mobilizados até que o governo apresente propostas salariais e de melhorias das condições de trabalho. Os funcionários concursados reclamam que desde 2003 não têm aumento. “Hoje ganhamos um terço do que ganha um auditor da Receita e metade do que ganha um gestor governamental”, disse Paulo Mendes, presidente do Sindicato Nacional dos Servidores Efetivos das Agências Reguladoras Federais (Aner). Os funcionários das agências ainda não foram incluídos em nenhum pacote ou MP de reestruturação da carreira. O fato de terem sido “esquecidos” pelo governo preocupa Paulo Mendes. “Iniciamos as negociações com o governo. Na SRH a informação é de que não haveria problema em incluir nossa categoria em alguma MP ou mesmo projeto de lei. Estamos em estado de alerta”, afirmou o representante da Aner.
Aumentos têm forte peso político
A série de reajustes autorizada aos servidores públicos federais tem um peso simbólico tão elevado quanto o fiscal. Em ano de eleições municipais e faltando pouco para a corrida presidencial de 2010, analistas apontam uma excessiva boa vontade do governo em compensar o tempo perdido, agradando a uma parcela importante da sociedade.
Para o professor Jorge Pinho, do Departamento de Administração da Universidade de Brasília (UnB), a maior parte do funcionalismo ainda ganha pouco. No entanto, carreiras ligadas à fiscalização, controle e arrecadação sempre tiveram tratamento diferenciado. Ao partir para aumentos no atacado, o governo tenta agradar à massa. “Vejo nisso uma razão, que é a preparação para as eleições de 2010. Há um uso do poder que o governo tem para pavimentar o terreno”, explicou.
A folha total de servidores, incluindo os três Poderes, deverá ficar neste ano por volta dos R$ 130 bilhões. Na relação gasto/Produto Interno Bruto (PIB), essa conta está sob controle, segundo justificativa do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Mesmo com o pedido de suplementação orçamentária feito ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a área econômica acredita que os custos com pessoal ficarão dentro dos padrões estabelecidos para este ano.
Nelson Marconi, professor de economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, disse que as mesas de negociação criadas pelo governo para resolver questões estruturais do funcionalismo se perderam no debate simplista de ações salariais. Segundo ele, a dificuldade da União em administrar seus recursos humanos transformou o Estado em refém das demandas de curto prazo. “A minha impressão é que os sindicatos não querem esperar o próximo governo, temem que a atual política de reajuste não seja seguida e queriam tirar proveito agora, já”, completou.
(Fonte: Correio Braziliense)
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