Governo tem dificuldade para definir contribuição da União, devido ao grande número de servidores aposentados por questões de saúde
A indefinição sobre qual será a participação do Estado no fundo complementar de Previdência do servidor público federal passa pela dificuldade do governo em lidar com o elevado número de funcionários do Executivo que se aposentam por invalidez. Atenta aos impactos contábeis que essas baixas podem causar ao equilíbrio atuarial do fundo, as áreas técnicas dos ministérios envolvidos no debate defendem a idéia de incluir essa variável no cálculo.
Daí porque a alíquota da União ainda não foi estipulada. Na semana passada, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), na apresentação a ministros, governadores e parlamentares omitiu, de propósito, o índice. O Ministério do Planejamento defende 7,5%, mas técnicos de outros setores ligados à área econômica dizem que a discussão está só começando. Há quem apoie fixar algo como 6% ou 6,5% e, com o passar dos anos, o órgão gestor do fundo poderia sugerir, caso fosse necessário, um aumento na participação da União.
A quantidade de pedidos de aposentadoria por incapacidade é um gargalo que incomoda a administração pública. Dados da Secretaria de Recursos Humanos (SRH) mostram que, em 2005, a média foi 2,42 vezes maior do que a apurada na iniciativa privada pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). De acordo com o Ministério do Planejamento, nos últimos seis anos, 13.835 servidores se aposentaram por invalidez — 10.162, segundo o governo, são passíveis de revisão.
Um histórico recente comprova que os pedidos de desligamento devido a problemas de saúde estacionaram em níveis alarmantes. Em 1999, a concessão de aposentadorias por invalidez sobre o total chegou a 21,1%. No ano seguinte, saltou para 30,6%. Já em 2001, caiu para 26,4% e em 2002 para 24,7%. Em 2003, primeiro ano da era Lula, o índice chegou a 13,1%, mas em 2004, explodiu para 28%. Em 2005, foi de 29,1% e no ano passado bateu os 25,8%.
Apontado como um alívio para os cofres públicos, o novo regime de Previdência do servidor tira da União o peso da responsabilidade de arcar com aposentadorias superiores a R$ 2,8 mil (o teto do INSS). Quem quiser e puder contribuir para receber um salário acima disso, quando parar de trabalhar, vai contribuir com o fundo complementar na proporção de 7,5% — se, por exemplo, a proposta do Planejamento prevalecer. Em cima da parcela-limite o servidor continuará sendo obrigado a recolher 11% enquanto estiver na ativa. Para atender a outra parte, nas palavras de um técnico que negocia com a Casa Civil, os servidores precisam ter em mente que vão bancar o “custo solidariedade”, que será compartilhado entre todos.
Um ou mais fundos?
A criação de um fundo único para os três poderes é motivo de discórdia entre os servidores. Os funcionários do Legislativo e do Judiciário defendem a criação de três planos de Previdência independentes, um para cada setor. Os trabalhadores do Legislativo ameaçam barrar a proposta no Congresso Nacional. “Com certeza teremos o apoio dos parlamentares para derrubar o projeto. O governo federal é livre para mandar o que quiser e o Legislativo é livre para mudar o que achar necessário”, avisa o presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Legislativo Federal e Tribunal de Contas da União (Sindilegis), Ezequiel Nascimento.
Se as regras que estabelecem o funcionamento do fundo complementar forem levadas ao pé da letra, a tendência é que seja criado um único fundo. O problema é que quando chegar ao Congresso a proposta sofrerá forte influência política. Temendo que esse movimento inviabilize o projeto, os ministérios da Fazenda, da Previdência e do Planejamento já sinalizaram que podem aceitar a criação de mais de um fundo, desde que todos respeitem as mesmas regras. Nos bastidores, Fazenda e Previdência Social também duelam para saber quem fiscalizará o novo fundo e como a receita acumulada durante os anos será aplicada.
A explicação para descartar o fundo único, segundo Ezequiel Nascimento, leva em consideração esse e outros cenários possíveis. A raiz de tudo, entretanto, é a falta de confiança do Legislativo e do Judiciário em ter o Executivo como força mais influente. “Vamos ter dificuldade de conseguir assento na gestão (conselhos administrativo, fiscal e deliberativo) e vamos reclamar para quem?” As diferenças salariais também preocupam. “Não podemos entregar nosso destino para alguém totalmente alheio à nossa realidade”, completa.
Unanimidade entre os servidores é a crítica em relação à falta de diálogo. “O governo está deliberando coisas sem ouvir as entidades. Isso é inadmissível”, diz Josemilton Costa, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef). “No fim de março teremos um congresso no qual esperamos já ter elementos para discutir a Previdência que será nossa”, reforça Roberto Policarpo, coordenador-geral da Federação Nacional dos Servidores do Poder Judiciário Federal e Ministério Público da União (Fenajufe).
Mariana Flores e Luciano Pires
Correio Braziliense
30/1/2007
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