Diagnóstico é que a queda das taxas de juros eleva muito o peso da contribuição sobre as aplicações financeiras
O governo terá de enfrentar, em algum momento, de preferência no próximo ano, o debate sobre a redução da alíquota da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). A queda na alíquota, hoje de 0,38% incidente sobre a movimentação bancária, será necessária para restabelecer o equilíbrio entre a cobrança da contribuição e a redução das taxas de juros. O diagnóstico da área econômica, compartilhado por economistas do mercado, é de que quanto menores os juros, maior o peso da CPMF sobre os depósitos e aplicações financeiras.
Os estudos que o Ministério da Fazenda vem realizando sobre o impacto da queda dos juros na chamada indústria bancária produziu seu primeiro resultado na semana passada, com a mudança na fórmula de cálculo da Taxa Referencial (TR). A taxa foi modificada para também compatibilizar sua incidência na correção dos depósitos em caderneta de poupança com o movimento de queda dos juros. Nesse caso específico, a medida impedirá uma concorrência predatória entre as diversas modalidades de aplicações financeiras – incluindo a opção por títulos do Tesouro – e as cadernetas de poupança. Sem a alteração, os depósitos em poupança seriam corrigidos em porcentual maior do que aqueles incidentes sobre as aplicações financeiras.
A dificuldade de a equipe econômica promover o debate em torno da CPMF, neste momento, está relacionado à impossibilidade de abrir mão de parte dos recursos. Afinal, a contribuição gera uma receita anual de R$ 32 bilhões. Caso se defina uma queda da alíquota para 0,08%, como sugerem os técnicos, a perda de receita poderia chegar a R$ 20 bilhões.
A equipe econômica avalia, no entanto, que essa discussão terá de acontecer em algum momento, porque o peso da CPMF nas operações bancárias está aumentando “tremendamente” com o cenário de inflação baixa e queda dos juros. “A redução da alíquota deve acontecer em algum momento. A CPMF, quando a inflação estava em níveis elevados, não pesava tanto sobre os rendimentos. Mas agora tem um peso expressivo”, reconheceu um ministro.
A questão, portanto, é apenas de tempo. O temor do governo é ser atropelado por essa discussão no Congresso, quando os parlamentares estarão votando a proposta de prorrogação da cobrança da CPMF com a alíquota de 0,38%, ainda este ano. A contribuição perde validade em dezembro, mas o governo irá sugerir a continuidade da cobrança exatamente porque não pode abrir mão dos R$ 32 bilhões que entram no caixa.
O ex-ministro da Fazenda Mailson da Nóbrega acha que o governo não pode fugir dessa discussão. “À medida que a taxa de juros vai caindo, fica evidente a perversidade que é a CPMF. Imagine o peso da CPMF numa economia como o Japão onde a taxa de juros é de 0,5%ao ano.”
A possibilidade de reduzir gradativamente a alíquota da CPMF foi considerada durante a elaboração do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mas foi rejeitada pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. A sugestão partiu do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, e contou com o apoio do secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Júlio Sérgio Gomes de Almeida. Ambos, no entanto, se renderam aos argumentos de Mantega a respeito do risco de forte perda de arrecadação, que seria agravada porque o governo já concordara com a adoção de novas medidas de desoneração de impostos.
O fato é que os técnicos voltam a bater na mesma tecla. O governo, segundo eles, não pode fugir ao debate. Mesmo a criação da conta-investimento, que isenta de CPMF as transferências de recursos de uma aplicação para outra, não elimina a perda de rendimentos no mercado financeiro. A redução gradual da alíquota, de acordo com os estudos técnicos, poderia ter início a partir de 2008 para atingir o nível de 0,08% em um período a ser definido pelo governo. A estratégia, portanto, permitiria uma previsibilidade na perda de receita até que a CPMF pudesse se tornar, apenas, um mecanismo de fiscalização. “Poderia ser feito um pacto com a sociedade”, argumenta uma fonte do governo
Um dos caminhos poderia ser, inclusive, a proposta de emenda à Constituição a apresentada no ano passado pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Ele sugere uma queda gradual da alíquota da CPMF, do índice atual de 0,38% para 0,08%, quando a contribuição se tornaria permanente.
Adriana Fernandes e Renata Veríssimo
O Estado de S. Paulo
12/3/2007
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