O governo já definiu qual será a política de correção salarial do funcionalismo público dos três poderes para os próximos anos: a variação do IPCA acrescida de 1,5% ao ano, que representa o crescimento vegetativo da folha de salários do Executivo, Legislativo e Judiciário. Essa é uma medida-chave para o programa de ajuste fiscal de longo prazo que já obteve aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Uma das preocupações dos juristas do governo era com a legalidade da proposta do Executivo limitar os salários de outros dois poderes. A conclusão, porém, é de que a própria Lei de Responsabilidade Fiscal determina que na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) o governo defina a expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado, e salários se encaixam nessa definição, podendo o gasto ser limitado pela própria LDO.
Ontem, Lula teve uma reunião de mais de oito horas de duração com os ministros da área econômica e com todos os demais ministros ligados à questão da infra-estrutura, além de presidentes de instituições financeiras federais, para discutir o programa de metas para os próximos quatro anos, que seria o sustentáculo dos investimentos públicos para o crescimento econômico de 5% ao ano com o qual o presidente se comprometeu.
A inspiração veio do Plano de Metas de JK, a experiência originária do planejamento governamental no Brasil, que consistiu num conjunto de 30 metas setoriais, além da meta-síntese de construção de Brasília. Assim, além dos investimentos setoriais servirem para atacar alguns pontos de estrangulamento, outros setores eram tomados como pontos de germinação, onde o investimento gerava demandas que acarretavam novos investimentos, sustentando a taxa de crescimento do país.
O plano de metas de Lula deverá ter cerca de 50 projetos prioritários de investimentos em transportes, energia e saneamento, sendo que alguns deverão ser parte dos projetos-piloto de investimento (PPIs), cujo conjunto de obras e projetos levantados pelo Ministério do Planejamento perfazem gastos da ordem de 0,4% do PIB.
Este ano, os PPIs podiam gastar até 0,15% do PIB sem que essa despesa fosse contabilizada nos cálculos das contas primárias como despesas. O governo, porém, não usou dessa prerrogativa, cumprindo rigorosamente a meta fiscal. Para 2007, o percentual previsto na LDO (ainda não votada no Congresso) subiria para 0,2% do PIB. Diante do compromisso de Lula com políticas de crescimento que levem o PIB a uma variação de até 5% ao ano, decidiu-se no governo mais do que dobrar os PPIs, para 0,5% do PIB, mesmo sabendo que não há estoques de projetos de infra-estrutura prontos para alavancar todo esse dinheiro, cerca de R$ 11 bilhões.
Pinçando tudo o que pode ser executado de obras e projetos, os técnicos do Planejamento conseguiram juntar investimentos públicos que equivaleriam a 0,4% do PIB já para o próximo ano, percentual que poderia ser abatido da meta de superávit primário de 4,25% do PIB para 2007, reduzindo a meta para 3,85% do PIB.
Não há a ilusão na área técnica, porém, de que seja possível desembolsar efetivamente todo esse dinheiro, dada a precariedade da capacidade de investimentos do setor público e da própria carências de projetos em estado de execução. Para se ter uma idéia, este ano o Orçamento atribuiu R$ 3 bilhões aos PPIs, mas será possível encerrar o exercício gastando apenas R$ 1,4 bilhão, deixando o restante, R$ 1,6 bilhão, para se incorporar aos projetos de 2007.
Para apresentar o programa de metas do segundo mandato, o governo quer dar um sentido de coerência com a preocupação fiscal. Assim, medidas serão tomadas para conter a expansão do gasto público corrente nos próximos dez anos, centradas nos reajustes de pessoal, Previdência Social -através da definição da política de reajuste do salário mínimo – e verbas para a saúde.
O presidente Lula ainda não arbitrou qual será a solução para os reajustes do salário mínimo. São quatro as hipóteses colocadas sobre a mesa: corrigir o mínimo pela variação do Produto Interno Bruto (PIB), pelo PIB per capita, pela variação do salário médio na economia ou ainda pelo IPCA mais um percentual fixo. A recomendação dos economistas oficiais recai sobre a correção pela variação do salário médio. O mínimo teria aumento real quando todos os demais salários também subirem. Essa é uma definição crucial para conter a expansão do déficit da Previdência Social, que neste ano deve bater em R$ 42 bilhões.
Na regulamentação da emenda 29, da saúde, além de mudar o indexador das receitas do PIB nominal, como é hoje, para o IPCA mais um aumento per capita, o governo deve se comprometer a aplicar esse diferencial de recursos em obras de saneamento básico.
Ontem, após a reunião no Planalto, a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, informou que o governo vai encaminhar ao Congresso a proposta de criação de um orçamento plurianual de investimentos, o que dará mais transparência e segurança jurídica e evitará que seja incorporado no preço das obras o risco de interrupção que existe atualmente em virtude de os recursos públicos estarem condicionados a orçamentos anuais.
A adoção deste tipo de orçamento é recomendada, segundo Dilma, porque a duração das obras e projetos na área de infra-estrutura geralmente extrapola o ano orçamentário. “Não é possível fazer investimentos por soluços”, reconheceu a ministra. A principal diferença entre um orçamento plurianual de investimentos e o atual Plano Plurianual (PPA) é que o segundo não indica obras, apenas determina as diretrizes. A idéia do governo é dar os respectivos valores para cada obra no decorrer da execução do projeto.
Na longa reunião de ontem, Lula e seus ministros também definiram projetos prioritários de infra-estrutura nos segmentos de logística, energia e saneamento. O foco esteve nas necessidades para o período 2007-2010, mas os projetos não foram identificados.
Claudia Safatle
Valor Econômico
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