A farra dos empregos comissionados custa à Câmara R$ 20 milhões por ano. Salários chegam a R$ 8,2 mil
Seiscentos cargos de confiança criados para assessorar órgãos técnicos da Câmara dos Deputados estão loteados politicamente entre 149 deputados e 24 ex-parlamentares — números que correspondem a um terço da Casa. Com salários entre R$ 1,9 mil e R$ 8,2 mil, esses assessores estão efetivamente acomodados nos gabinetes dos deputados, nos cargos da Mesa Diretora, nas lideranças partidárias e até nos escritórios dos deputados nos seus estados de origem. Há cargos ocupados por parentes de parlamentares, sem contar os funcionários fantasmas. Somados, resultam numa despesa extra mensal de R$ 1,6 milhão — ou R$ 20 milhões por ano. O campeão de nomeações é o primeiro-secretário da Câmara, Inocêncio Oliveira (PL-PE), com 55 cargos.
Levantamento dos cargos de natureza especial (CNEs) da Câmara, obtido com exclusividade pelo Correio, traz uma informação inédita. Ao lado do nome do assessor, da lotação oficial (órgão técnico) e da lotação efetiva, aparece o nome do parlamentar que fez a indicação. Depois de Inocêncio, um ex-presidente da Câmara, aparece o corregedor da Casa, Ciro Nogueira (PP-PI), com 39 cargos. Ele é o responsável pela abertura de processo contra deputados por quebra de decoro parlamentar. Em seguida, vem o segundo secretário da Câmara, Nilton Capixaba (PTB-RO), com 31 cargos. O petebista é um dos parlamentares que responderão a processo no Conselho de Ética sob acusação de envolvimento com a máfia dos sanguessugas.
O presidente do Conselho de Ética, Ricardo Izar (PTB-SP), também aproveitou a oferta de cargos. Indicou dois para a Procuradoria Parlamentar e um para o próprio Conselho de Ética. Como havia uma forte demanda, ou seja, a necessidade de julgar muitos casos de deputados que faltaram com a ética, o conselho aproveitou a brecha para o desvio de função e reforçou o seu quadro de assessores.
A Câmara conta com 15,6 mil funcionários na ativa. Apenas 3.579 são efetivos (contratados mediante concurso público). Nos gabinetes, estão lotados 9.821 secretários parlamentares, com salários entre R$ 300 e R$ 4 mil. São de livre nomeação. Além desse quadro, existem mais 2.266 CNEs, espalhados principalmente pelos cargos da Mesa Diretora e pelas lideranças partidárias, mais órgãos técnicos. São igualmente cargos de livre nomeação. Seus ocupantes podem ser demitidos a qualquer momento. Inicialmente, os CNEs foram criados para suprir uma carência de pessoal na Casa, enquanto não havia concurso público. As seleções públicas começaram, as contratações ocorreram, mas os parlamentares continuaram se valendo dos cargos para empregar quem bem entendem.
Baixo clero
Quem tem mais poder, consegue mais cargos. Inocêncio, por exemplo, é o responsável pela administração da Casa. Mas mesmo deputados do baixo clero (parlamentares de pouca expressão política) acabam nomeando um ou dois afilhados políticos. Há também os casos de “jeitinhos”. A liderança do PSC, por exemplo, tinha um quadro de funcionários, mas o partido perdeu deputados e a liderança foi dissolvida. Os cargos foram colocados à disposição da Câmara. Porém, o presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), cedeu os cargos à reintegração da liderança, e os funcionários retornaram ao gabinete.
A Presidência da Câmara, por intermédio da sua assessoria de imprensa, afirmou que o levantamento do preenchimento dos CNEs foi feito pela Diretoria Geral da Casa, a partir de uma solicitação de informações feito a pedido do Ministério Público Federal. Constatados os atuais casos de desvio de função, a Diretoria da Casa vai elaborar agora um estudo para dar “um novo perfil e uma nova configuração jurídica” para os CNEs, segundo informou a assessoria. Esse trabalho será concluído em outubro.
Fabíola Góis e Lucio Vaz da equipe do Correio
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