Sindicatos aproveitam o resultado da negociação com controladores de vôo para obter cumprimento de acordos e reajustes salariais. Do seu lado, governo ameaça enviar projeto que regulamenta lei de greve

A forma como a greve dos controladores de vôo chegou ao fim fez crescer dentro de outras categorias do setor público o sentimento de que, quando confrontado, o governo cede. Confiantes nisso, sindicatos que representam servidores que atuam em ramos tão fundamentais à sociedade como o monitoramento aéreo se preparam para aumentar a pressão contra o Palácio do Planalto em busca de melhores salários, do cumprimento de acordos antigos e de investimentos. Em resposta a um possível levante, o governo ameaça acelerar o envio ao Congresso Nacional do projeto de lei que regulamenta a greve no funcionalismo.

Recém-saídos de uma paralisação de 24 horas, realizada na semana passada, agentes e delegados da Polícia Federal articulam um novo protesto. Desta vez, os sindicatos nos estados se descolaram da influência das associações nacionais e, de forma autônoma, decidirão como o movimento acontecerá. Em São Paulo, por exemplo, a categoria firmou posição e marcou para amanhã — às vésperas do feriado da semana santa — uma operação-padrão no aeroporto da capital (Congonhas) e de Guarulhos (Cumbica), além do porto de Santos (o mais movimentado do país). Ontem, reunidos em assembléia, os policiais federais no Distrito Federal decidiram que vão aguardar o encontro com técnicos do Ministério do Planejamento e adiaram a greve. “Se a proposta for boa, não vamos paralisar. Se for ruim, faremos o maior movimento da nossa história”, avisa Luís Cláudio Avelar, presidente do sindicato no DF.

O movimento dos policiais e agentes federais confronta o discurso do governo de que a categoria se dispôs a negociar com paciência. Ontem o clima era de revolta contra as declarações do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. O principal negociador do presidente Lula declarou que desconhecia o acordo fechado em 2006 — aumento de 60%, concedido em duas parcelas, o que irritou delegados e agentes. “O problema todo foi o descaso do governo. Houve um acordo, que está sendo descumprido”, resumiu Joel Mazo, presidente do Sindicato Nacional dos Delegados da Polícia Federal (Sindepol).

Regulamentação

Considerada área essencial, a PF está na lista dos órgãos públicos que podem ser impedidos por lei de parar. Na minuta de regulamentação do direito de greve no serviço público, que está engavetada no Ministério do Trabalho, constam outras atividades classificadas como primordiais. Entre elas, as exercidas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), pelos órgãos de vigilância sanitária e inspeção agropecuária, por defensores públicos, auditores e fiscais tributários, além dos controladores de vôo.

O texto inclui uma série de serviços prestados por concessionárias estatais ou privadas, incluindo transporte, tratamento e abastecimento de água, coleta de lixo e esgoto, distribuição e comercialização de gás. Tão logo consiga liberar a pauta da Câmara dos Deputados — aprovando as medidas provisórias do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) — a intenção do governo é remeter o texto que vai endurecer as regras de greve no setor público.

As greves do funcionalismo ficaram mais longas nos últimos três anos. Só no primeiro semestre de 2006, os trabalhadores federais cruzaram os braços por 5,4 mil horas, quase o total do tempo parado durante 2005 inteiro e mais do que todo o ano de 2004 — nos seis primeiros meses do ano passado, os funcionários do governo federal fizeram 24 greves.

Protagonistas de uma paralisação de cerca de três meses em 2005, os servidores do INSS se articulam para duelar com o Ministério do Planejamento. Insatisfeita com a forma como o PAC congelará o crescimento da folha de pessoal — teto de 1,5% real para os gastos nos próximos 10 anos —, a categoria irá às ruas exigir a retirada desse item da pauta de prioridades do Executivo. No dia 17 de abril, os funcionários do INSS e outras categorias pretendem fazer um grande protesto batizado de Dia Nacional de Luta.

Como forma de amenizar os ânimos, o governo anunciou no mês passado a retomada da Mesa Nacional de Negociação do setor público. Desativada desde o ano passado, essa instância marcou uma nova era nas relações entre o governo e as entidades. A disposição em negociar, no entanto, não convence os servidores. É o caso dos funcionários do Banco Central, que votarão hoje um indicativo de greve por tempo indeterminado a partir do dia 11. “O clima é de desmotivação e há condições para uma paralisação”, disse David Falcão, presidente do sindicato que representa os servidores do BC.

Na primeira reunião com seus auxiliares depois da reforma ministerial, Lula fez ontem uma veemente defesa do papel do Estado e da estabilidade dos serviços prestados pelos servidores.

Luciano Pires

Correio Braziliense

3/4/2007