Conclusão está no relatório da comissão parlamentar que investigou tráfico de armas apreendidas pela polícia no Rio
Diferentemente do que afirmavam fabricantes e comerciantes de armamento no país, as armas usadas pelos criminosos do Rio saem de lojas, de empresas de segurança privada e das forças públicas de segurança, como polícias estaduais e Forças Armadas, segundo relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre Organizações Criminosas do Tráfico de Armas divulgado ontem no Congresso Nacional.
Pela conclusão da CPI, 86% das armas usadas pelos criminosos têm origem legal: 68% foram vendidas por empresas brasileiras diretamente para lojas localizadas em Nova Iguaçu, Rio de Janeiro, Niterói, Duque de Caxias, Nilópolis, Campos e São João do Meriti, além de outras localizadas em São Paulo, Assunção e Pedro Juan Caballero, no Paraguai. As demais 18% são armas que foram compradas pelo poder público e desviadas para o crime.
CPI rastreou 10.549 armas apreendidas no Estado do Rio
Os dados estão num documento elaborado pela sub-relatoria de Indústria, Comércio e Colecionadores, Atiradores e Caçadores da CPI, a partir da análise de informações inéditas enviadas pelos fabricantes brasileiros. Foi feito o rastreamento de 10.549 armas apreendidas pela polícia no Estado do Rio entre 1998 e 2003, todas envolvidas em situação ilegal ou de delitos no momento da apreensão. As informações foram cruzadas pelo Sistema Nacional de Armas (Sinarm) da Polícia Federal.
Das armas vendidas por lojas, o rastreamento provou que 74% foram compradas por pessoas físicas, os chamados cidadãos de bem; 25% delas foram vendidas para empresas de segurança privada, transportadoras de valores e departamentos de segurança de empresas privadas; 0,6% saíram das lojas para órgãos do Estado; e 0,3% vendidas para outras pessoas jurídicas.
– Esses dados oficiais desfazem outra crença muito comum, a de que a maioria dos delitos é cometida com armas de origem ilegal, de que o mercado legal, dos homens de bem, nada tem a ver com o mercado clandestino. Pelo contrário, o mercado legal abastece o ilegal. Daí a importância de se fiscalizar melhor o comércio legal para evitar que ele abasteça os criminosos – disse o coordenador do Programa de Armas do Viva Rio, Antônio Rangel Bandeira, que prestou assessoria técnica aos deputados.
A conclusão mais surpreendente foi a constatação de que 18% das armas rastreadas foram originalmente vendidas ao Estado, especialmente às forças de segurança pública (polícias Militar, Civil, Federal), às Forças Armadas e aos demais órgãos públicos. Ainda segundo os dados obtidos pela CPI, das armas vendidas ao Estado, cerca de 70% foram desviadas das forças de segurança pública do país, e o restante das armas foi parar nas mãos dos criminosos em sucessivos desvios de quartéis do Exército (22%), da Aeronáutica (4%) e da Marinha (1%).
– Isso é muito grave. Detalhando o número, ficou comprovado que, da Polícia Militar, saiu boa parte das armas que estão com os bandidos (52%). De secretarias de segurança pública, os bandidos conseguiram 8% das armas e, da Polícia Civil, 1%. O rastreamento também identificou que saíram para o mercado ilegal armas do Departamento de Polícia Federal (2%), do Corpo de Bombeiros (1%), da Polícia Rodoviária Federal (0,4%), além de quartéis das Forças Armadas – afirmou Rangel.
55% das armas tinham registro antes de ir para crime
No levantamento da CPI das Armas foram excluídas as armas do patrimônio do Estado do Rio, que ficam na Divisão de Fiscalização de Armas e Explosivos (Dfae) aguardando perícia. Ficou provado ainda que 86% das armas apreendidas em situação ilegal no Brasil e rastreadas foram desviadas em território brasileiro. Destas, 11% foram exportadas e contrabandeadas via Paraguai. A grande maioria (94%) das armas encontradas com os criminosos é de revólveres e pistolas, o que derruba a percepção de que as armas ilegais são, em sua maioria, de grosso calibre, como fuzis e metralhadoras.
A CPI chegou a outras conclusões: 55% tinham registros antes de passarem às mãos dos bandidos, o que, segundo a CPI, sepulta a idéia de que a maioria das armas usadas pela criminalidade é de armamento ilegal. Comprova-se que os bandidos se abastecem de armas legais, desviadas ou roubadas de empresas legalizadas e de cidadãos de bem.
O Globo
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