Polícia investiga ligações feitas por envolvidos na compra do dossiê com servidores da administração federal

Cuiabá — A Justiça Federal no Mato Grosso determinou que órgãos da administração pública indiquem os responsáveis e usuários de linhas que apareceram na quebra do sigilo telefônico dos petistas envolvidos no escândalo do dossiê contra tucanos. A medida foi tomada a pedido da Polícia Federal. Os investigadores querem identificar, a partir dessa informação, aquelas pessoas que mantiveram contato com os suspeitos. São analisadas chamadas originadas e recebidas por eles nos trinta dias que antecederam a apreensão dos R$ 1,7 milhão, encontrados, num hotel de São Paulo, em poder de Valdebran Padilha e Gedimar Passos.

Era de se esperar, durante a pesquisa, que surgissem números usados por servidores públicos por causa dos vínculos partidários ou pessoais entre alguém que ocupa um posto no governo e os seis petistas investigados. Chamou a atenção da polícia, no entanto, que alguns telefones apareceram repetidas vezes às vésperas de o grupo tentar fechar a compra do dossiê com o empresário Luiz Antônio Vedoin, acusado pelo Ministério Público de chefiar a máfia dos sanguessugas.

De acordo com um dos investigadores, sabe-se, por exemplo, que um dos acusados conversou por telefone com gente do Ministério da Integração Nacional. Outros órgãos na Esplanada também apareceram na quebra do sigilo telefônico. Uma vez identificados, os responsáveis pelos aparelhos deverão prestar informações à PF sobre o motivo das chamadas. No total, a polícia já teve acesso, por determinação judicial, a 750 cadastros telefônicos, a partir do acesso às ligações realizadas por Expedito Veloso, Gedimar Passos, Hamilton Lacerda, Jorge Lorenzetti, Osvaldo Bargas e Valdebran Padilha.

Operações cambiais

A lista das pessoas que tiveram contato telefônico com o grupo será cruzada com a dos responsáveis por cerca de 200 mil operações cambiais acima US$ 10 mil realizadas nos trinta dias anteriores à apreensão do dinheiro. Do confronto desse material, a Polícia Federal espera chegar a pessoas que tenham participado da operação desastrada e não foram revelados até o momento. Encarregados da investigação têm, cada vez mais, a convicção de que os acusados tentam proteger gente graúda. Trabalha-se com a suspeita de caixa 2 e outras hipóteses. Durante a semana, levantou-se a suspeita de que a origem pode ter sido ilícita, o jogo do bicho por exemplo. No caso do dinheiro em reais (R$ 1,1 milhão), há notas miúdas de R$ 10 e R$ 5 no volume apreendido.  

Abel negocia audiência

A Polícia Federal no Mato Grosso tentava confirmar até ontem à noite a data para o depoimento do empresário Abel Pereira, amigo e ex-assessor do prefeito de Piracicaba (SP), Barjas Negri (PSDB).

Advogados procuraram o delegado Diógenes Curado, responsável pelo inquérito, e o informaram que seu cliente estaria disposto a viajar a Cuiabá para a audiência. O policial ficou de analisar a proposta, mas até o fechamento desta edição ainda não havia se decidido.

Segundo entrevista do empresário Luiz Antônio Vedoin à revista IstoÉ, Abel atuava como intermediário para liberação de emendas de interesse da máfia dos sanguessugas durante a gestão Negri, sucessor de José Serra no Ministério da Saúde.

São investigadas pela polícia denúncias de que Abel teria recebido propina de Luiz Antônio em troca do tráfico de influência, por meio de depósitos bancários feitos pela Klass, ligada à Planam, a contas indicadas por ele. Ele também é acusado de ter sido beneficiado em licitações na época em que Negri comandava o ministério. No início da semana, a Justiça Federal de Mato Grosso determinou, a pedido do Ministério Público Federal, a quebra de sigilos bancário e fiscal do empresário. Em depoimento ao juiz Jeferson Schneider, da 2ª Vara Federal no estado, na última quarta, Luis Antônio reforçou as acusações. Revelou que mais de R$ 3 milhões em verbas teriam sido liberadas nesse esquema. (MR)

Auditor pede ajuda

O auditor Wagner César Vieira, do Tribunal de Contas da União, foi ontem a tarde à Polícia Federal pedir proteção a ele e a família. Vieira diz estar sofrendo ameaças desde que rejeitou uma oferta de suborno doze dias atrás. Ele está cedido à CPI dos Sanguessugas, onde auxilia o sub-relator de sistematização, deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP). O auditor depôs por seis horas ao delegado de plantão, David Sérvulo, e prometeu conceder hoje uma entrevista coletiva para contar detalhes.

Algumas informações truncadas chegaram a vazar do depoimento. Vieira disse que, em meio a uma conversa de técnicos da CPI, um servidor do Banco Central teria insinuado que ele poderia ganhar R$ 1 milhão caso concordasse em enviesar a investigação. Vieira diz que seu trabalha na CPI vem sendo cerceado pelo assessor de um senador.

Suborno

A partir da suposta tentativa de suborno, ele estaria recebendo seguidas ameaças pelo telefone. A mais recente delas teria acontecido ontem mesmo, no início da tarde. Depois dela, o auditor pegou a mulher e o filho e foi para o prédio do TCU. Disse que dormiria lá, pois estava com medo de morrer. O presidente do tribunal, Guilherme Palmeira, foi avisado e concordou com a solução de o assunto ser levado à PF. 

Marcelo Rocha

Correio Braziliense