Após três meses sem votar, deputados examinam 20 MPs, limpam a pauta e devem analisar hoje proposta que acaba com o voto secreto
Sem votar uma matéria desde 14 de junho, a Câmara retomou em ritmo intenso os seus trabalhos na noite de ontem – primeiro dia do esforço concentrado de setembro. De uma só vez, os deputados votaram simbolicamente as 20 medidas provisórias (MPs) que obstruíam a pauta da Casa e as mandaram para o Senado, abrindo caminho para a votação da proposta de emenda constitucional (PEC) que acaba com o voto secreto no Congresso. A idéia é examinar também a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, a minirreforma tributária e o projeto da Timemania.
De cara, os deputados atenuaram o vexame do último esforço concentrado, realizado há um mês, quando não conseguiram votar sequer uma proposição. Na época, a falta de consenso em torno da MP que reajustava o vencimento de aposentados com renda acima de um salário mínimo provocou a obstrução dos trabalhos pela oposição. No Senado, o último esforço concentrado antes das eleições se dará apenas hoje e amanhã.
A votação em bloco ontem foi possível devido a um acordo entre os líderes de bancada. Das propostas aprovadas, dez fazem parte do pacote de MPs feitas pelo governo em junho para reajustar vencimentos do funcionalismo público. Outras quatro liberam crédito de R$ 2,15 bilhões para ministérios e a Justiça Eleitoral.
As deliberações ocorreram de maneira simbólica, o que permitiu a aprovação de uma medida a cada cinco minutos. No fim da sessão, a Mesa Diretora recebeu ofício da Casa Civil solicitando a retirada do pedido de urgência de cinco projetos de lei que também trancavam a pauta da Casa.
Voto secreto
Com a pauta livre, o Plenário pretende examinar a PEC do Voto Aberto ainda esta tarde. A pressão em torno da votação da matéria, de 2001, começou por conta dos processos de cassação contra os acusados de envolvimento com a máfia das ambulâncias. Os congressistas acreditam que, com o voto secreto, a possibilidade de ver repetido o fiasco da absolvição dos mensaleiros é enorme. Ontem foram designados os relatores dos 67 processos de cassação dos acusados de envolvimento com os sanguessugas.
Porém, a conclusão da análise da PEC pela Câmara antes das eleições é praticamente impossível. Isso porque ela precisa do aval de pelo menos 308 deputados, em dois turnos de votação. Além do elevado quórum, a menos de um mês das eleições, seria necessário um acordo entre as lideranças partidárias para quebrar o prazo regimental de cinco sessões entre um turno e outro e encaminhar o texto ao Senado. As votações deste mês se encerram amanhã.
Brecha na lei
O grande problema é que ainda não há acordo em torno do texto a ser votado. A proposta original era de acabar com todas as votações secretas no Congresso (além das cassações, a análise dos vetos presidenciais e as eleições dos integrantes das Mesas da Câmara e do Senado). Mas, como a oposição resiste à mudança, a tendência é que a emenda se restrinja às votações de cassação.
O líder dos oposicionistas, José Carlos Aleluia (PFL-BA), defende uma brecha para que, em alguns casos de cassação, a votação secreta seja mantida. Na avaliação dele, o acordo fechado ontem prevê tão somente o fim da “obrigatoriedade” do voto secreto, ou seja, não o inviabiliza.
O artigo 188 do regimento interno da Câmara diz que se um décimo da Casa (51 deputados) apresentar requerimento, e ele for aprovado pelo Plenário com maioria simples, qualquer votação pode ser secreta. Segundo Aleluia, em determinados casos, o sigilo é benéfico ao interesse público. Isso se daria em acusações de cunho político ou quando o parlamentar acusado use de ameaças para que colegas não votem contra ele.
O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), disse ontem que o texto ainda está sendo definido. “Estamos trabalhando em um texto que permita a votação da matéria o mais rapidamente possível”, afirmou o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP).
Mudanças sindicais adiadas
As únicas propostas rejeitadas ontem pelo Plenário foram as MPs 293/06 e 294/06, que propunham mudanças na estrutura sindical e das relações de trabalho. A primeira reconhecia as centrais sindicais como entidades representativas dos trabalhadores. Já a segunda criava o Conselho Regional de Relações doTrabalho, órgão subordinado ao Ministério do Trabalho e composto por representantes do governo federal, dos trabalhadores e dos empregadores.
Nas galerias do plenário, sindicalistas protestavam contra as duas propostas, sustentando que elas concentrariam poder nas centrais sindicais e retirariam dos sindicatos o poder de negociar salários e receber a contribuição sindical. Quando as MPs foram rejeitadas, eles cantaram o hino nacional.
O líder do governo na Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), disse que o governo não deixará as duas matérias de lado. “Uma parte do movimento sindical é a favor dessas mudanças”, afirmou.
Refis 3
Uma das propostas aprovadas ontem foi a MP 303/06, a do chamado Refis 3. A medida autoriza o parcelamento, em até 130 prestações mensais, das dívidas de pessoas jurídicas com a Receita Federal, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que venceram até 28 de fevereiro de 2003.
A autorização se aplica a todos os débitos, inclusive aqueles que já foram parcelados e cujas parcelas não tenham sido quitadas. Os beneficiados deverão desistir de todas as ações judiciais movidas para questionar as dívidas. A adesão implicará confissão de dívida. No cálculo do total a ser pago, as multas serão reduzidas em 50%.
Não poderão ser parcelados os débitos referentes a impostos e contribuições descontados na fonte e não recolhidos à Fazenda Nacional ou ao INSS, valores recebidos por agentes arrecadadores e não recolhidos aos cofres públicos e relativos ao Imposto sobre a Propriedade Rural.
O pedido de parcelamento deverá ser protocolado até 15 de setembro, e o cálculo da quantia devida será apurado no mês do requerimento. Nenhuma parcela poderá ser inferior a R$ 200 para optantes do Sistema Integrado de Pagamento de Impostos das Microempresas e Pequenas Empresas (Simples) e R$ 2 mil para as demais pessoas jurídicas.
Veja quais foram as propostas aprovadas ontem pela Câmara:
– MP 295/06: reajusta os vencimentos de diversas carreiras do Executivo federal, incluindo a de analistas e técnicos do Banco do Brasil;
– MP 296/06: cria 8.593 cargos e funções no ensino profissionalizante mantido pelo governo federal;
– MP 297/06: regulamenta as atividades de agente comunitário de saúde e agente de combate às endemias;
– MP 298/06: abre crédito extraordinário de R$ 1 bilhão para a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM), usada para regular os preços dos produtos agrícolas;
– MP 299/06: libera R$ 925 milhões do orçamento da União para ações de investimento de nove ministérios e da Justiça Eleitoral;
– MP 300/06: autoriza a liberação de R$ 200 milhões para pagamento dos anistiados políticos com direito a indenização da União;
-MP 301/06: mais extensa editada pelo governo em junho, muda gratificações, institui planos de carreira, cria cargos e regulamenta o auxílio-moradia concedido a funcionários públicos. Beneficia 320 mil servidores e tem impacto estimado em R$ 439 milhões nos cofres públicos em 2006;
– MP 302/06: faz parte do pacote de medidas editadas em junho para a remuneração de servidores públicos.
– MP 303/06: autoriza o parcelamento, em até 130 prestações mensais, das dívidas de empresas com o Fisco (Refis 3);
– MP 304/06: cria o Plano Geral de Cargos do Poder Executivo (PGPE) das carreiras do Ministério do Meio Ambiente e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama); dos servidores dos antigos territórios do Acre, Amapá, Rondônia e Roraima e do quadro funcional das agências reguladoras;
– MP 305/06: fixa subsídio em parcela única para as carreiras de procurador da Fazenda Nacional, advogado da União, defensor público da União, procurador do Banco Central, policial federal e policial rodoviário federal;
– MP 306/06: estabelece valores dos soldos militares das Forças Armadas;
– MP 307/06: trata da Vantagem Pecuniária Especial (VPE) devida aos servidores da Polícia Militar do Distrito Federal e do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal;
– MP 308/06: fixa o subsídio dos cargos das carreiras de Delegado de Polícia do Distrito Federal e de Polícia Civil do Distrito Federal;
– MP 309/06: cria o Plano Especial de Cargos da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN);
– MP 310/06: abre crédito extraordinário de R$ 14,87 milhões em favor da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia (Hemobras);
– MP 311/06: abre crédito extraordinário de R$ 208 milhões para os Ministérios da Justiça e da Integração Nacional;
– MP 312/06: prorroga até 2008 o prazo para que os trabalhadores rurais do extinto Funrural requeiram aposentadoria por idade.
Diego Morais do Congresso Em Foco
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